30 DE SETEMBRO DE 2024
Diante da intensificação da perseguição religiosa na Nicarágua, muitos cristãos estão se reunindo secretamente em suas casas para cultuar a Deus, evitando chamar a atenção do governo autoritário de Daniel Ortega. Desde o início dos protestos populares em 2018, o regime de Ortega já dissolveu mais de 3.550 ONGs, incluindo várias de origem evangélica, o que tem gerado grande preocupação entre as comunidades cristãs.
A crise política e social na Nicarágua se agravou após as eleições gerais de 7 de novembro de 2021, quando Daniel Ortega foi reeleito para seu quinto mandato consecutivo. Desde então, pelo menos 256 igrejas evangélicas foram fechadas, conforme dados da organização de direitos humanos Nicarágua Nunca Más. Além disso, mais de 200 líderes religiosos fugiram do país, com 20 deles sendo destituídos de sua cidadania e outros 65 enfrentando acusações de conspiração e outros crimes.
John Britton Hancock, diretor do ministério Mountain Gateway, afirma que há cerca de 100 pastores presos atualmente. Em meio a essa atmosfera de insegurança, muitos cristãos foram forçados a se adaptar para continuar a praticar sua fé. Um desses exemplos é o diácono Francisco Alvicio, de 63 anos, que lidera uma congregação da Igreja da Morávia. Ele e sua comunidade enfrentaram repressão do governo e, por isso, passaram a se reunir em casas particulares.
“Se eu for perseguido na igreja, ainda tenho minha Bíblia“, disse Francisco, em entrevista à AP News. Nos últimos anos, a denominação Morávia, que conta com mais de 350.000 membros em todo o país, foi alvo de vigilância intensiva por parte do governo, que infiltrou agentes nos cultos. “Chegar com uma arma não é bondoso. Se alguém entra em uma igreja vestindo um uniforme, falando alto, é para intimidar”, acrescentou.
Segundo Open Doors, além das tentativas de intimidação, o governo impôs novos impostos e exigiu que as igrejas mudassem seus logotipos. “Não aceitamos”, disse Francisco. “Não podemos mudar algo só porque o governo quer. O único caminho que seguimos é o de Deus”.
Com o medo de represálias, muitos membros das igrejas deixaram de comparecer aos cultos nos templos e passaram a se reunir secretamente nas casas. As reuniões ocorrem às 4h da manhã, com conversas em voz baixa e em locais que mudam constantemente, tudo para evitar a detecção pelas autoridades.
Francisco, que fugiu para a Costa Rica após denunciar a vigilância, o assédio e a prisão de líderes religiosos, mantém sua fé firme apesar da perseguição. “Nós, os morávios, acreditamos que onde quer que estejamos, podemos orar a Deus”, afirmou. “Eu posso andar, falar e pensar com esse poder, sabendo que, mesmo que eu esteja sozinho, Ele estará comigo”.
Outro pastor da Igreja Morávia, cujo nome não foi revelado por questões de segurança, também fugiu da Nicarágua após descobrir que o governo estava atrás dele. Agora, sua congregação se reúne em casas para cultuar, enquanto ele mantém contato com os fiéis à distância. “O governo quer controlar tudo”, denunciou o pastor. “Eles temem que, se alguém falar contra o governo, o povo se levante”.
Anna Lee Stangl, chefe de defesa da organização cristã CSW, que luta pela liberdade religiosa, afirma que tanto igrejas católicas quanto protestantes enfrentam as mesmas táticas de repressão do governo. As restrições incluem limitações à duração e frequência dos cultos, proibição de procissões, invasão de igrejas por homens mascarados, roubo e destruição de objetos religiosos, além da infiltração de informantes.